Numa organização da Junta de Freguesia de Alcáçovas, Município de Viana do Alentejo, e da Associação de Defesa do Património de Alcáçovas, em parceria com o projecto (a)Riscar o Património (DGPC + USkP) terá lugar no dia 3 de Setembro, um encontro de desenho/sketching no Centro histórico de Alcáçovas.
A hora marcada para início do percurso é 10h00.
A actividade é gratuita, no entanto, as primeiras 12 inscrições terão direito a almoço e material de desenho. Para tal deve ser utilizado o endereço:
aaa.alcacovas@gmail.com
Desenhar Alcáçovas: entre a linha imaginada e a luz alentejana
Que o Alentejo tem sido descoberto pela paisagem, histórias e sabores, já não é novidade. De vários países, repetem-se publicações a destacar a pureza do Alentejo e o sentimento de plenitude que vários lugares trazem.
Talvez seja novidade, porém, que ainda há Alentejo por descobrir. Um Alentejo de mão cheia, a tão curta distância. Do Algarve, toma-se a mítica EN2, que em Alcáçovas tem um dos seus pontos mais próximos de Lisboa. Para quem quer passear além da auto-estrada, Alcáçovas é mesmo um óptimo plano para quem vem das praias do sul.
Pouco antes de se chegar à vila, a paisagem impressiona. O montado ganha uma expressão plena, com as copas dos sobreiros a pontilhar os montes com uma sombra agradável. Até que as curvas suaves da EN2 se entregam às ruas brancas da vila. Alcáçovas teve a arte chocalheira classificada Património Imaterial UNESCO. Uma arte que testemunha o passado pastoril e a doce relação com o montado, a dar sustento à terra. Mas o que por ali se vê é uma sucessão de largos e jardins, numa zona histórica cheia de surpresas.
Hoje parece lendário, mas aconteceu naquela vila alentejana: as viagens marítimas dos países ibéricos foram ali acordadas. Foi no Tratado de Alcáçovas, assinado por D. Afonso V de Portugal e pelos Reis Católicos, que se decidiu: as ilhas Canárias passariam para Castela, deixando Portugal navegar além do Bojador, isto é, a sul do paralelo 27. O Paço onde D. João II recebeu os embaixadores castelhanos é visitável desde 2016.
Pode ser pretexto para começar a desenhar, levantando velhas e novas questões: seriam sustentáveis as linhas de fronteira, em tempos ali desenhadas? Podem as linhas do desenho corresponder ao que se vê? Naturalmente tratam-se de uma abstração; só por coincidência alguém reconhece, num desenho com linha, a pessoa na rua, a janela do paço ou a capela do horto, também conhecido por jardim das conchas. Há não muito tempo, o Paço ameaçava ruína. A sua recuperação também foi fruto do trabalho incansável da Associação dos Amigos de Alcáçovas que, desde o ano 2000, não parou de lembrar a sua importância para a globalização e o estado de esquecimento a que estava voltado. Agora, com o Paço cuidado, a associação continua a fazer o património local conhecido e acarinhado pelos alcaçovenses e a partilhá-lo com quem o queira descobrir.
Há mais para ver (e desenhar) à volta. São casas apalaçadas, templos impecavelmente caiados de branco, que dão uma escala humana, intemporal, àquelas ruas. Quem estiver menos à vontade com a linha, pode sempre lançar algumas manchas no papel, seguindo os jogos de luz e sombra da vila de Alcáçovas.
Parece que a frescura da luz azul, que as paredes em sombra recebem do céu, leva ao repouso, mesmo nas horas de maior calor. Colina acima, chega-se à igreja matriz, que tem modos de catedral. O interior é de uma hallenkirsche, ou igreja-salão, desenhada para que o interior parecesse único, coeso, sem obstáculos. Ver a pesada abóbada apoiada em tão finas colunas, faz parecer vê-la levitar sobre a extensa planura que se vê daquele alto.
À volta de Alcáçovas, muito fica por ver. A barragem do Núncio é das mais antigas estruturas em betão do país: data de 1907 e é um feito de engenharia. Oferece vistas sobre o rio Xarrama, ondulando calmamente entre colinas de montado. O grupo Alcáçovas Outdoor Trails conhece os caminhos à volta como ninguém, e mostram-nos nas caminhadas gratuitas que organizam. São caminhos de um Alentejo bem-amado, onde o tempo não corre, a paisagem é sustentável e passa de geração em geração. Isolado numa colina, levanta-se o santuário quinhentista da Senhora da Esperança, onde chega uma estrada.
Dali, o Sol dourado põe-se atrás da Serra da Arrábida. É ver para crer, como a linha do horizonte ali chega tão longe.